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Mas quem sou eu mesmo? Nem eu sei se calhar. Em busca, permanentemente em busca!

terça-feira, abril 15

album (parte sete)

Mamadu Seidi era um Homem Grande em Tite. Não que fosse corpulento. Ser Homem Grande era ser considerado, respeitado, um estatuto de venerável.

A sua idade, nunca soube ao certo, mas deveria andar entre os sessenta e os setenta.

A sua tabanca era passagem obrigatória no caminho de um dos obuses onde fazia prevenção nocturna, a sua companhia, obrigatória.

Varias foram as noites no seu alpendre, oferecendo-me um banco tosco, uma amena cavaqueira. Da guerra, das suas experiências, da vida e sua concepção. Respeitava-me, devolvia-lhe esse sentimento. Noites quentes, escuras, palavras pausadas, silêncios profundos de entendimento e partilha, sons cientificamente identificados de bicho ou geograficamente situados se de rebentamentos longínquos.

Anos atrás, Mamadu era guia das tropas portuguesas, pisara uma mina, ficara sem o pé. Como era um homem considerado pelas forças portuguesas, foi evacuado para Bissau e posteriormente para Lisboa. Fez a recuperação no Alcoitão.

A sua narração do contacto com Lisboa era de uma simplicidade e autenticidade enorme, um deslumbramento! Recordo a descrição dos prédios, “tabanca sobre tabanca”, e os carros, as pessoas, o ritmo da capital. Nunca esquecera!

Apesar de incapacitado, apesar de recordar o sofrimento, não transmitia amargura. Tranquilidade, isso sim.

À luz difusa de um candeeiro a petróleo, exibia com orgulho o cartão da União Nacional e as listas de contactos de Generais e altas patentes militares. Alguns tinham sido seus cicerones em Lisboa.Olhava, respeitava! A minha opinião...guardava-a para mim!

Mamadu tinha dois filhos, ambos militares do meu pelotão de artilharia. Mamadu, quarentão, e Abdul, ligeiramente mais novo. Dois filhos de duas mulheres em comunhão de espaço e afecto.

Com orgulho e ternura, falava-me dos dois filhos. Sim, porque isto de afectos e sofrimentos,mesmo em outras cultura, não há fronteiras.

Apreendi uma filosofia de vida muçulmana, simples, exigente, aprendi humildemente a respeitar, devolvi o respeito!



3 comentários:

Maria José disse...

A partilha que encanta a vida de quem ousa ver mais além; aprender e enriquecer-se. E aos outros.

Aninhas disse...

Uma perguntinha indiscreta. Foste estudante de Coimbra?
Resto de boa semana e de boas memórias

Alma Nova ® disse...

Quando respeito é o mote, a vida enriquece-nos e a partilha revela-se um enorme baú de vivências onde mergulhamos o espírito.

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