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Mas quem sou eu mesmo? Nem eu sei se calhar. Em busca, permanentemente em busca!

quinta-feira, novembro 27

album (parte nove)


Aquela ideia que germinava na minha cabeça, o querer ser útil, fazer qualquer coisa para além da minha actividade bélica, encontrava cada vez mais terreno fértil.
Tinha o motivo, tinha a matéria prima, faltava-me a iniciativa. E tomei-a. Reunido com os meus soldados africanos, propus-lhes uma infiltração (palavra em voga em termos militares) pelos campos das letras e números. Chegámos a um consenso embora com muita incredulidade. E passámos à acção! Não se pretendia certificações, orientávamos pelo gozo do exercício do desafio e aquisição de novas descobertas.
Envolvi quem me poderia facultar livros escolares e tomamos uma sala anexa à “radio Tite”, um altifalante colocado no alto difundindo as escolhas musicais de um outro voluntário ou inconformado de sua condição de beligerante à força.
E iniciámos a caminhada. Entusiasmados, de um lado quem queria poder saber ler, do outro quem se julgava ser capaz de lhes proporcionar esse conhecimento. Mas não só, havia algo mais em mim de interesse, uma busca de fuga, um consumir de minutos, horas, um contrariar a condição de militar.
Apesar de todos estarmos de prevenção madrugada dentro, às nove horas assumíamos o compromisso da presença.
De início foram só os meus soldados africanos. Depois, um ou outro elemento da população, jovens que, assumindo a sua condição, ousavam querer ir mais além. Turma cheia, olhos vivos, brilhantes, ouvidos sôfregos, manuseamentos de lápis em gesto tosco em mãos hábeis em objectos bélicos. Dos encontros surgiam seduções, pequenas conquistas, sorrisos por vezes gargalhadas de cumplicidade, manifestações despreocupadas de prazer.
Não esqueço, e se isso fosse possível, ainda possuo os aerogramas que me foram escritos pelo Pedro, Joãozinho, Adulai e outros.
Letras! Mais desenhadas que outras, de tamanhos diferentes e de diferentes dificuldades de escrita. Mas letras, carregadinhas de sentimentos, de imagem, somente transmitidas até aí pela voz!
Sempre que evoco este episódio, recordo o quão difícil foi explicar, perante uma imagem do livro, o que era e como funcionava uma televisão. Eh, Eh, ecoavam em sorrisos incrédulos. A voz, tal como a rádio...vá lá, mas a imagem? Eh, Eh! Disse que sim, e pronto, não tinha nem argumento nem meio para mais!
Mas nem isso era importante, verdade ,verdadinha é que descobrira uma forma de me reencontrar, adquirir asas e soltar-me para além da “bolanha”!
Este contacto permitia-me estar mais com as pessoas, com suas aspirações, seus sonhos. E havia, estivesse eu atento. Aprendi, troquei.Hoje caminho felizmente em terrenos bem diferentes mas carrego a história de mim mesmo. E sorrio, em paz!
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