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Mas quem sou eu mesmo? Nem eu sei se calhar. Em busca, permanentemente em busca!

domingo, novembro 18

album (parte três)

A LDG atracava a um cais apoiado em troncos, rio dentro. Em terra olhos curiosos, alguns de naturais outros de militares perscrutando as novidades, avaliando a mercadoria nova. Desembarcavam-se pessoas, produtos, víveres e bebidas, muitas bebidas. Ali, também quase despejado, aguardava que alguém me recolhesse!
E aconteceu. Poucos quilómetros percorridos por boa estrada ladeada de bolanhas, verde insinuante aquático, arroz, disseram-me. Mais ao longe mas bem visível, um aglomerado de “casas”, tabancas, dizem-me e até o nome da aldeia, que não fixo. Em tempos esta região fora considerada o celeiro da Guiné.

O Batalhão de Tite estava a acabar a comissão. Gente dura, experiente no dizer dos próprios. Percurso feito num Jeep, eu mudo de espanto e expectante, convenientemente atento às rajadas de perguntas e histórias dos meus anfitriões de ocasião. E, de onde és…viste crocodilos no Geba…quanto tempo tens de tropa…a malta isto…a malta aquilo, vais ver…toma cuidado…um dia…conheces o…?
Nem tinha tempo de falar…E seria mesmo necessário? Afinal o importante ali era a evocação da sabedoria, da experiência, das histórias de preferência que me induzissem medos! Não era por mal, digamos que uma tradição de quem está, para quem chega. Que fazer senão tentar concordar, ambientar-me, sorrir, nem que amarelo fosse!

Estamos a chegar, vês o arame? Uma cerca de arame farpado alongava-se contornando algumas tabancas, envolvendo a aldeia. Passado este “portão”, uma outra cerca limitando a área militar, construções de alvenaria, telhados de luzalite e zinco, desta vez com "porta de armas"! E tinha uma zona para içar a bandeira, parada e tudo! Parecia mesmo um quartel!

O 6º pelotão de Artilharia era constituído por três Obuses 105 (tecnologia avançada,começaram a ser fabricados em 1931!!!) colocados estrategicamente na periferia da cerca exterior, dezanove homens, dezasseis eram Guineenses.
O Faustino, um algarvio forte não gordo como me dizia, passava-me o testemunho. Acabava a comissão. No semblante denunciadores, a saturação, a ânsia do regresso. Como se impunha, para além das burocracias, havia que apresentar os homens. Pelotão formado, depois me apresentar, pedi um a um que dissesse o nome. Estão a ver a cena, não estão? Os meus ouvidos habituados a José, Manuel, António, Silva, confrontaram-se com Abdul, Malan, Adulai, Joãozinho, Jau, Baldé, Seidi, etc, etc. Quando quis demonstrar o quanto eram importantes para mim, depois de ouvidas estas duas pautas de estranhas notas, tentei dirigindo-me a cada um, identificá-los…tentei, disse. Ao Adulai chamei Adelaide, ao Abdul, Malan, e não sei porquê ao menos corpulento…Joãozinho! Fiasco, gargalhada geral. Decididamente frustrante!
Ao fim de algum tempo, aprenderia a reconhecer as pessoas, sua identificação. Na Guiné há uma panóplia de etnias, e só no meu pelotão havia Balantas, Fulas, Mandingas, cada uma com a sua carga cultural. Qualquer dia falo sobre esta coexistência nem sempre pacífica!

5 comentários:

Alma Nova ® disse...

Um mundo de vivências, expectativas e... medos. Medos por descobrir, terra para desbravar, na esperança de sobreviver.

SILÊNCIO CULPADO disse...

Porque és um visitante especial, que deixa nas ideias as suas convicções e o calor humano do respeito e da amizade, deixei-te, no meu blogue, o símbolo do nosso aperto de mão.
Obrigada pela tua presença amiga

Tiago R Cardoso disse...

Muito bem excelentes textos que tem cá colocado com umas recordações.

Como sou um fã deste tipo de historias, aguado por mais.

quintarantino disse...

vou mantendo a leitura...

SILÊNCIO CULPADO disse...

Como ficam marcadas estas imagens que ainda mexem passados tantos anos? Que sóis, que glórias, que mágoas e profundezas se misturam? Que alma é tão grande que tudo acoite e ainda diga?

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